sexta-feira, 14 de outubro de 2011

A IMINENTE FALÊNCIA DO TEATRO EM CURITIBA

Quando terminar o ano de 2011 e os teatros curitibanos, incluindo aqui os teatros públicos, fizerem seus balanços chegar-se-á a uma conclusão que deverá acender um grande sinal vermelho para o setor.  Nunca houve tanta oferta e tão pouca demanda. Isso mostra um descontrole que vem afetando a presença do púbico nas produções locais. Se nada for feito para regular o frágil mercado de teatro em Curitiba será o colapso do setor. Vamos queimar café.
Teatro Lala, sem público não dá.
Espetáculos curitibanos que se mantinham quase que exclusivamente de bilheteria já não o fazem mais. Salas vazias, mudanças constantes na programação, tentativas de acerto e nada. Público que é bom passou a ser artigo de luxo em qualquer teatro local.
Muitas companhias no desespero de manter a casa cheia ou ver alguém na platéia apelam para sites de vendas coletivas puxando para baixo o valor médio praticado e habituando o público a pagar cada vez menos pelo valor de um ingresso. Além disso, este sistema é passível de investigação pelo Ministério Público, já que desrespeita e burla a legislação da meia-entrada, fazendo com que na prática todos paguem menos que a metade da meia-entrada. Compra coletiva não funciona em um mercado tão restrito e particular como o cultural. As conseqüências são visivelmente catastróficas.

Quanto vale o show? Nada?

Em outra ponta os espetáculos subvencionados através das Leis de Incentivo, federal ou municipal no caso de Curitiba, geralmente gozam de uma qualidade artística que independe de seu sucesso na bilheteria. Se a demanda por este tipo de produto abaixa o produtor em teoria vê-se na obrigação de abaixar o preço visando atrair mais público. O produto está pago. Não há motivo para cancelar uma apresentação. Se for o caso o mesmo pode até realizar apresentações de graça. Se pensarmos pelo lado do dinheiro público, seria um raciocínio justo. Sob a ótica do mercado este produtor está errado. Está criando um abismo na diferença de preço entre o mercado teatral local e aquele que “importamos” do Rio ou de São Paulo.
Pensemos o mercado teatral como uma praça de alimentação de um pequeno centro comercial de um bairro. Isso é o teatro de Curitiba em relação ao Brasil. Nesta praça o valor médio de uma refeição é R$ 15,00. O que acontece se um determinado comerciante entrar neste mercado e oferecer um produto melhor a um valor de R$ 10,00 gozando ainda de incentivos fiscais para sua produção? A resposta é clara: Quem vai pagar continuar pagando os R$ 15,00? A tendência econômica é o preço baixar.
Mas se neste cenário entra um novo “player”? Que também recebeu incentivos fiscais para sua produção e assim como o outro não tem custo operacional? Com medo de “jogar fora” sua produção, no caso fazer apresentações para ninguém ou até mesmo cancelar, resolver cobrar R$ 5,00? Ou mesmo doar toda a sua produção? Obviamente a praça de alimentação irá a falência.

A curva da oferta e demanda tem que se
encontrar para definir preço.

O mercado teatral local é um mercado muito pequeno em razão da baixa demanda. Aumentar a oferta, vender a baixo preço ou mesmo doar ingressos cria prejuízos enormes à sustentabilidade do mercado. Além disso, nem sempre o preço é a variável decisiva que leva as pessoas ao teatro. Há que se haver estímulo, necessidade de se consumir cultura.
William J. Baumol and William G. Bowen já explicaram isso nos Estados Unidos nos anos 60 com “O dilema econômico, ou a teoria dos custos no setor das artes cênicas”. Esta teoria é o fundamento da economia da cultura que hoje faz parte da nova economia ou economia da criatividade. Conceito criado no Reino Unido dez anos atrás.
Em outras palavras o público está se habituando a pagar muito pouco pelo teatro que  consome aqui. Se somarmos a isso o aumento na oferta de “produtos similares chineses”, como shows de stand-up feitos nos bares curitibanos, além da oferta de “importados de qualidade”, como os grandes espetáculos do Rio e São Paulo que se tornam verdadeiros objetos de desejo de um público emergente, fica claro que o mercado está se autodestruindo.
Estamos literalmente queimando nossa produção.
Cada cadeira vazia significa dinheiro indo pro ralo.
Para os próximos anos será pior. A produção de cultura em Curitiba receberá grandes incentivos através da nova Lei Estadual de Incentivo que tramita na assembléia. Sem dúvida nenhuma uma conquista definitiva, necessária e higiênica para todos os artistas do Paraná. Porém isso irá aumentar ainda mais a oferta para uma demanda cada vez mais reprimida.
Ou seja, teremos que queimar o café, como se fez no passado quando o mercado desta “commodity” entrou em colapso.

MARINO GALVÃO JR
Ator, diretor e produtor teatral. Mestrando em Gestão do espetáculo e da Indústria Cultural pela SDA BOCCONI – Milão Itália.  Atualmente colabora na área de planejamento e marketing do Piccolo Teatro de Milão.


7 comentários:

  1. Oi Marino. Resisto bravamente aos sites de compra coletiva pelos motivos apresentados aqui e outros mais. No Antropofocus™ sobrevivemos graças aos ingressos e já nos doí bastante a meia entrada praticada de maneira vergonhosa

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  2. Excelente análise, Marino.

    Abraço!

    Chico Pennafiel

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  3. Agradeço ao Careqa e a vocês por ter aberto os trabalhos. Estou de acordo que estamos gastando muito em uma lógica de projeto quando já deveríamos estar na lógica de processo. A análise é econômica e do ponto vista da minha área: cênicas. O maior problema em Curitiba é afastar as pessoas do consumo. Precisamos de ações embasadas em economia que regulem a oferta e a procura. Curitiba pode consumir mais e o assunto tem de ser discutido. De preferência já.

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  4. Parabéns pela análise, Marino. Fico assustado quando vejo os preços dos ingressos do teatro produzido em Curitiba. Colaboram para desvalorizar o produto na mente do consumidor potencial.

    Abraço,

    M. Cidade

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  5. Apoiado Marino...além de tudo que foi citado aqui...com essa desvalorizão do teatro em Curitiba os atores,atrizes acabam trabalhando quase de graça, com cachês bem abixo do normal, vamos melhorar isso!!! Já!!!

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  6. Olá Mariano. Acredito que mesmo um mercado restrito como o da arte, não conseguirá escapar dos novos mecanismos do mercado de consumo. O momento de crise econômica, obviamente leva o público a um afastamento das atividades artísticas, em detrimento à produtos de primeira necessidade ou de produtos culturais mais baratos ou gratuitos.

    Esses mecanismos de compras coletivas fazem parte da realidade e é um modelo de negócio que vem crescendo muito. O problema é que muitos clientes se acostumam a comprar apenas por esses mecanismos e não se tornam clientes da empresa anunciante, mas sim da empresa que promove as ofertas. Mas há também quem faz bom uso dessa ferramenta e conquista clientes pela qualidade e continuidade dos seus serviços. Entendo que pode levar à desvalorização do produto, já que a lógica de compras coletivas está diretamente ligada a produtos de alta demanda, de maneira que a grande quantidade de pessoas que circulam em um determinado estabelecimento possam gerar lucros posteriores. Se a demanda é baixa, essas ofertas não têm o efeito de agregar um público novo, e sim o mesmo público com preços mais baratos.

    Quanto ao problema da baixa demanda por atividades artísticas, acredito que não seja apenas uma questão econômica. Se os teatros estivessem cheios de quinta a domigo, que mal teria vender o ingresso com 50% na segunda feira? A questão é: Por que não temos essa demanda?

    De fato faltam políticas de valorização da arte que contemplem atividades de formação de platéia na educação básica. O teatro, a música e artes em geral são atividades poucos estimuladas na educação básica e visivelmente desvalorizada na sociedade brasileira.

    Para formar platéia, é preciso que a arte e os artistas estejam nas escolas. É preciso mostrar a música e o teatro para as crianças desde cedo; falar sobre a profissão; sobre o processo, que é esquecido em detrimento ao produto.

    É preciso criar mecanismos que promovam a sustentabilidade da atividade artística, até mesmo para que os projetos incentivados tenham um bom público, e cumpram sua função de difundir a cultura. Acredito que investir nas novas gerações e em ações sociais que promovam atividades artísticas, oficinas de formação e conhecimento sobre arte em geral, é um caminho para gerar essa demanda de que o mercado cultural necessita.

    As políticas públicas de fomento à cultura não conseguem suprir essa demanda com suas contrapartidas sociais. Precisamos de um Ministério da cultura forte e competente, (e que bom se fosse) que trabalhe em conjunto com o Ministério da educação; que se dedique a políticas públicas de educação e fomento à atividade artística; e não somente discuta o destino das verbas das leis de incentivo.

    Falei demais....

    Abraço

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  7. Perfeito o artigo e a citação de WILLIAM BAUMOL que tem a teoria da FATALIDADE DOS CUSTOS . Se em curitiba esta ruim sem a Lei de incentivo do Estado pode se preparar que vai ficar pior. As leis de incentivo tiveram muitos méritos mas entre os desvios existentes destaco o que chamo de FILHOS DA LEI . São aqueles que se intitularam PRODUTOR DE TEATRO a partir da criação da Lei de Incentivo. EM MG são quase centenas na CAPITAL e isso inflacionou a OFERTA e nada se fez para ampliar a DEMANDA. E querendo ou não querendo os "artistas puros" o MERCADO é implacavél. Com certeza a QUEIMA DE CAFÉ será nacional.

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