sexta-feira, 18 de março de 2011

CULTURA: NOVO PARANÁ E O VELHO MUNDO

Paulino: recuperando o atraso.
Bons ventos sopram na Terra de Vera Cruz. Parece que a cultura começa a "Caminhar"

O secretário de Cultura Paulino Viapiana acaba de anunciar o retorno de um importante instrumento no financiamento de projetos culturais paranaenses. O edital "Conta-Cultura" que consiste na centralização e distribuição dos recursos disponíveis pela Lei Rouanet das empresas estatais paranaenses, como a Copel, Sanepar e Compagás através uma comissão estruturada pela secretaria de Cultura.
- Será que todo esse lucro financia também a arte?
- Não sei, 1 bilhão é muita coisa!!!
Funciona assim: quem aprova um projeto na Lei Rouanet do Ministério da Cultura pode pleitear os recursos das estatais desde que o mesmo passe por uma segunda análise em nível estadual.

Se olharmos os números de 2009, disponíveis no balanço da empresa, somente a Copel poderá dispor de mais cinco milhões de recursos oriundos do Imposto de Renda Pessoa Jurídica. Valor que pode ser muito maior devido ao lucro real da estatal, que em 2009 chegou a mais de um bilhão de reais. O secretário disse ainda que vai atrair empresas privadas para o projeto, o que no passado tentou-se sem muito sucesso.
Cabe lembrar que durante o Governo Requião estes recursos eram utilizados na sua maior parte no Museu Oscar Niemeyer, órgão que era ligado diretamente ao governador, ou ainda em projetos de interesse específico como o Festival de Cinema realizado pela atriz Ítala Nandi, diretora da Escola de Cinema do Paraná. Uma relação pouco clara de aparelhamento das estatais. Como quase sofremos em nível federal com o secretário Luis Gushiken da SECOM. 
Vanhoni propôs 11 anos antes a Lei Estadual
nos moldes da Lei Municipal de Curitiba
Mas a "novidade" que causa grande expectativa é a aprovação de uma Legislação Estadual de Incentivo à Cultura prometida para 2012. A lei estadual na realidade foi aprovada na Assembléia Legislativa há onze anos.

Proposta pelo então deputado estadual Ângelo Vanhoni a lei permitiria cessão de parte do ICMS recolhido para investimento em cultura. Na época o governador Jaime Lerner vetou o projeto sob a alegação inconstitucionalidade e por ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Depois saiu de cena e o novo governo nunca quis discutir a proposta.

MON: 8 anos de vacas gordas recursos mil e daí?
Se existisse hoje no Paraná estaríamos ao lado de estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Pra se ter uma idéia, São Paulo anunciou recursos na base de R$ 60 milhões através de sua lei estadual de incentivo à cultura neste ano. Certamente se tivéssemos algo do gênero o Teatro Guaíra não estaria passando pelas dificuldades que atravessa e produziria uma dezena de espetáculos, de ópera, dança e teatro.

O Museu Oscar Niemeyer estaria consolidado como pólo das artes visuais no Brasil. Haveríamos uma intensa programação cultural no interior do estado. As crianças teriam uma atenção especial afinal temos um teatro para crianças e uma formação musical infantil que é referência no Brasil. Por todo o lado e em cada cidade haveriam instrumentos culturais públicos ou privados que tornariam a vida, dos paranaenses no mínimo mais feliz.
Teatro Guaíra velho de guerra. Até quando?
Cultura deve ser apartidária. Não convêm defender correntes, partidos, pessoas. Devemos defender as atitudes. E infelizmente em nosso estado nos últimos 12 anos faltaram pessoas e veículos de comunicação com postura firme em defesa da cultura, da constituição e da legislação.
Pra sair da atmosfera teatral cito o cinema do Paraná. Os dois editais que houveram durante o Governo Requião produziram dois filmes reverenciados pela crítica. "Misteryos" e "Corpos Celestes". Se tivessem havido os editais (previstos anualmente por lei) hoje teríamos circulando no mínimo outros quatro loga-metragens.  Além de outros oito tele-filmes previstos pela mesma lei. Nossa produção cinematográfica estaria tão constante que justificaria a existência de uma Escola de Cinema que formaria jovens roteiristas e diretores que ao lado de nossos artistas fariam da E-Paraná uma das televisões educativas mais produtivas do país. Talvez houvesse menos delinquência juvenil e menos consumo de drogas, mas quem pode dizer?
O estado tem o dever constitucional de investir em cultura mas o problema básico é: sob que ótica isso acontece? O prêmio da Secretaria de Cultura para estes dois filmes tornou possível a captação de mais recursos demonstrando o potencial de investimento em nosso estado e capacidade de nossos produtores. Ou seja: convém financiar 100% um produto cultural com recursos públicos? Ou com um estímulo de 70% de um projeto podemos aquecer o mercado e gerar mais investimentos? No mundo inteiro pra se conseguir um financiamento você tem de ser capaz também de se auto-financiar ou conseguir agregar parcerias.  Assim o estado financia projetos que se mostram mais sustentáveis. 
Non basta dire merda!
Deve dire que sono bravo. Caspita!!!
Se alguém estiver disposto pode ler o post "Fundações Bancárias". Ali eu explico como funciona a Fundação CARIPLO. A maior da Itália que despeja 80 milhões de euros para a cultura na Lombardia, uma região menor que o Paraná. Um ente que financia ao máximo 70% de um projeto. E muitas vezes somente disponibiliza o recurso depois de ver o projeto pronto e executado. Financia a qualidade artística e aquele agente cultural que consegue parcerias, obtém mais recursos, cria e atende uma demanda.

Coincidentemente nas últimas duas semanas estamos tendo aulas de gerenciamento de projetos, contabilidade, tributação e HRM (gestão de recursos humanos). Tem sido terrível descobrir que em comparação com a Itália vivemos em um paraíso fiscal. Jamais pensei que fosse possível dizer isso do Brasil, mas nossa legislação ainda é mais competitiva que a dos Italianos. Aqui uma alíquota mínima de IRPF é 25% pra todos que ganham mais de 6000 EUROS/ano (o que é nada se pensarmos que ninguém ganha menos de 900 EUROS/mês). A previdência consome 33% do cachê de um artista e se for um profissional ainda se desconta 10% de IVA (imposto sobre o valor agregado). Ou seja, o cachê de um músico, ator, etc, pode chegar a apenas 32% do que foi orçado. Significa que um cachê de 1000 EUROS rende 320 EUROS líquido para um músico profissional. 
230 milhões e 60% retornam ao governo.
Negócio da china em plena Itália
E se pro artista a situação é ruim, para o produtor não muda muito. Podemos ver alguns casos em que você recebe 100 mil EUROS pra fazer um espetáculo, mas o empenho público é para o outro ano. E para receber tem de comprovar ter feito projeto.

Ou seja, ou o produtor tem um capital de giro para realizar o projeto e receber um ano depois ou deve recorrer a um empréstimo bancário para poder realizar o mesmo. Este empréstimo custará uns 6% ao ano. Muito menos que os 8% ao mês do Brasil. Mesmo assim é um sistema cruel que faz até mesmo os bancos lucrarem com o mercado cultural. Já pensou o blog da Bethania?

Colocando isso na atual realidade italiana onde o Fundo Único para o Espetáculo recebeu um corte de 50% chegando aos pífios 230 milhões de euros para todos os entes lírico-sinfônicos, teatros de tradição, teatros de prosa estáveis, circuitos, grupos, companhias, etc. É possível imaginar como estão os ânimos dos produtores culturais por aqui.
De qualquer forma é sempre uma boa notícia saber que no Brasil marchamos na contra-mão, ainda mais neste "mediterrâneo" de notícias ruins que circulam pela Eurropa. Nesta mesma semana observamos um estudo recente mostrando que a cada 1 EURO investido em cultura este gera 2,59 EUROS em movimentação da economia. Se a fórmula valer para o Paraná certamente nosso estado vai recuperar o tempo perdido ao longo dos últimos 12 anos. Mas pra isso é preciso mobilização de todos nós. Artistas ou não.

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