quarta-feira, 20 de abril de 2011

RICCI/FORTE - "TROIA'S DISCOUNT"

Ricci/Forte, ícones do teatro de inovação italiano
Tive que passar um tempo sem escrever. Não por vontade minha, mas por problemas técnicos que me deixaram sem internet. Infelizmente preciso estar conectado pra escrever. Como fiquei pra trás e tenho muito assunto pra compartilhar preferi começar pelo teatro. De certa forma é o melhor lado de assuntos como política e gestão cultural.

Duas semanas atrás estive novamente ao Elfo Puccini, sala Fassbinder pra assistir "Troia's Discount" espetáculo da Cia Ricci/Forte. Stefano Ricci e Giani Forte respectivamente diretor e autor do espetáculo. A dupla é considerada pela crítica italiana como intensa, feroz, inquetante, polêmica e forte. Concordo. Do espetáculo saí pensativo e chocado pelas imagens que vi. Será?

Com um texto muito bem construido e cenas milimetricamente pensadas para público alvo, na sua maioria LGB, o espetáculo consegue uma cumplicidade com cada espectador. Ao início se vêm os atores com luz de serviço, (uma moda viral que muito me chateia pois acaba com a possibilidade de estética do teatro) entre eles dois "ragazzi" completamente nús dentro de carrinhos de supermercado.

Os rapazes se vestem pra trágica "balada"
Durante a peça figuram os devaneios de um transexual atacado ao soro hospitalar que vestido com a camisa da "azzurra" e com a coroa do burguer-king mais parece a própria "regina" Itália pedindo socorro. Uma "ragazza" magra e com cabelos curtos que conta a sua história de abuso sexual.

E uma "donna" de meia idade que sofre com a falta de desejo do companheiro. Todas estas histórias vão se intercalar no final com a morte de um dos rapazes depois de cometer atrocidades para se autoafirmar, como colocar fogo em um supermercado e descobrir depois que sua única necessidade era relacionar-se sexualmente com o amigo incendiário.
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Colpiram-me o desenho de cena e o texto, que discutia o amor e fazia uma crítica à sociedade consumista italiana. A interpretação idem. Uma forte entrega dos atores. A direção em sintonia com todo o resto soube aproveitar recursos que se encontram no super-mercado da esquina para evidenciar a selvageria consumista contemporânea, como quando a "ragazza" magra completamente nua vai parar dentro do carrinho de mercado e é sufocada por uma montanha de "korn-flakes".

Tudo era bom. Mas não era ótimo. Talvez porque venho de um país onde a miséria ainda impera. Entendo todos os dramas da peça. Mas ainda não consigo entender como dois jovens classe média vestindo roupas de grife vão incendiar um supermercado.
Final do espetáculo com a ragazza de voz rouca.
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Será que não entendo? Outro dia li no jornal que um jovem classe média de 17 anos foi espancado por 5 euros e ficou 20 dias no hospital. Isso em plena Via Monza com pessoas que passavam e nada faziam.

Na volta do espetáculo no metrô de Milão refleti: o PIB brasileiro encostou no PIB italiano. São 2,04 trilhões. Mas somos 5 vezes a população da Itália.
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Tenho medo de nosso futuro. Tenho medo do país rico e sem pobreza onde uma classe emergente sobe aí. Com ela vem os sedentarios pelo consumo. Sem educação, sem conceitos, sem valores. Se antigamente temíamos os jovens que roubavam pra comer e agora vamos temer aqueles que incendeiam pra zoar...

P.S. Gostei de "Troia's Discount", mas a história não acaba aqui...

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